Covid-19 e legislação trabalhista: veja o que muda com a MP 927

Especialista alerta que ações das empresas devem ser compatíveis à urgência que o momento exige e sugere atenção à MP 927

Diante da pandemia da covid-19 , estamos vendo diversos impactos do surto nas relações de trabalho, especialmente em razão de medidas de enfrentamento que orientam distanciamento social, quarentena e até o isolamento das pessoas. Nesse cenário de apreensão, após antecipar um pacote de alterações à legislação trabalhista, foi editada no último domingo a Medida Provisória nº 927 oficializando ações que as organizações poderão adotar nesse período.

Como alerta Luciana Gouvêa, Sócia e Head do Departamento Trabalhista da Melo Campos Advogados, está em curso uma reação em cadeia que inevitavelmente irá transformar o mercado. “As empresas já sentem os impactos da pandemia, vendo-se obrigadas a reorganizar a dinâmica de trabalho de seus empregados e até paralisar, integral ou parcialmente, outros setores de sua produção, seja em razão do afastamento de seus próprios empregados ou pelos impactos sofridos pelos seus fornecedores”, avalia.

A legislação trabalhista e o teletrabalho

Para Luciana, a MP 927 faz uma menção importante ao modelo de teletrabalho tendo em vista as obrigações que as organizações têm com seus funcionários ainda que eles não estejam fisicamente presentes.

“A adoção do home office foi uma das primeiras medidas sugeridas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e demais organismos de saúde para evitar o contágio e a transmissão da covid-19. Neste caso, embora o distanciamento social tenha sido uma recomendação, entendemos que, em razão da responsabilidade que o empregador assume quanto à saúde e segurança do trabalhador, a formalização do home office é importante para regulamentar essa situação”, pontua.

Como a especialista explica, a norma permite que, durante o estado de calamidade pública, as empresas usem essa modalidade da forma que for conveniente. Ela frisa ainda que não há a necessidade de acordos individuais ou coletivos, nem mesmo o registro prévio da alteração no contrato.

Contudo, Luciana ressalta que os custos necessários para viabilizar a permanência do funcionário em home office devem ser observados por empregador e empregado.

“As disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho na forma de home office e ao reembolso de despesas arcadas pelo empregado deverão estar previstas em contrato escrito, firmado previamente ou no prazo de trinta dias, contado da data da mudança do regime de trabalho”, esclarece.

De acordo com a especialista, a medida também estende a autorização do formato a estagiários e aprendizes. No entanto, Luciana recomenda que, em relação a esses trabalhadores, o empregador esteja atento às disposições trazidas pelo Ministério Público do Trabalho na Nota Técnica 05/2020, da Coordenadoria Nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente.

Impactos do isolamento

Mesmo com a opção do home office prevista pela legislação trabalhista, ainda há quem exerça funções que não podem ser realizadas remotamente, mas que precisa ser isolado por estar no grupo de risco ou por ter sido exposto ao vírus.

Para esse grupo, Luciana explica que a Lei 13.979/2020, de 7 de fevereiro, determina que o período de ausência, incluindo o “isolamento” e a “quarentena”, será considerado falta justificada ao serviço público ou à atividade laboral privada.

Por outro lado, a portaria Nº 356, de 11 de março de 2020, informa que as medidas de “isolamento” deverão partir de prescrição médica, enquanto “quarentena” será determinada por ato administrativo de responsabilidade de autoridades de saúde locais ou federais.

A especialista acrescenta ainda que o afastamento deve atingir em breve todos os que apresentarem sintomas de resfriados, sendo exigidos que essas pessoas apresentem atestados médicos e que aqueles que residam com elas também sejam afastados de seus trabalhos.

Por fim, Luciana Gouvêa aconselha que as empresas se antecipem para traçar uma estratégia prevendo esses casos. “É recomendável que as empresas negociem acordos e/ou instrumentos coletivos de trabalho, prevendo flexibilização de horários, especialmente para os funcionários que integrem grupos vulneráveis, o abono de faltas sem a apresentação de atestado médico àqueles que apresentarem sintomas sugestivos da covid-19, entre outras medidas necessárias para conter a transmissão da doença, a fim de trazer mais segurança jurídica às decisões que envolvam os empregados”, pontua.

Receios e reflexos futuros

Além das definições acerca do trabalho remoto, a MP 927 traz ainda outros pontos como:

  • Antecipação de férias individuais;
  • Concessão de férias coletivas;
  • Aproveitamento e antecipação de feriados;
  • Uso do banco de horas;
  • Suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;
  • Diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

Luciana Gouvêa faz um alerta para possíveis reflexos negativos após o período atual. “É muito preocupante, por exemplo, analisar os termos da MP 927 editada para viabilizar a adoção de medidas pelas empresas, mas, simultaneamente, verificar manifestações de representantes da justiça e ministério público sobre a inconstitucionalidade das medidas autorizadas. Essa insegurança tende a agravar a crise e desenhar um cenário de muita judicialização após o encerramento da pandemia”, avalia.

Momento de revisão interna

Sendo assim, é crucial que mesmo as companhias mais cautelosas quanto à segurança de seus empregados e às boas práticas de trabalho revejam suas culturas. “Não há dúvidas de que essa pandemia traz um alerta às empresas quanto à urgência de reavaliarem seus processos produtivos e os seus formatos de trabalho, passando por medidas que envolvem a proteção da saúde do trabalhador e modelos mais flexíveis de jornada de trabalho, por exemplo”, aponta.

Para Luciana Gouvêa, não há como negar que o momento é de incerteza, não apenas de como lidar com a Legislação, mas acerca do futuro das relações de trabalho. E isso exige cautela acima de tudo.

“Como não é possível prever os desdobramentos e tampouco o tempo em que essa situação perdurará, é recomendável que as empresas tomem as medidas que lhe trouxerem mais segurança para conduzir o caso, estando atentas às normas e recomendações que diuturnamente têm sido expedidas pelos órgãos oficiais, e procurem apoio jurídico preventivo”, completa.

Diante deste cenário de incertezas, é imprescindível estar bem informado para tomar as decisões certas. Assine nossa newsletter e receba notícias sobre RH e legislação, sempre embasadas nas opiniões de especialistas da área trabalhista e de gestão de pessoas.

Rômulo Santos

Rômulo Santos

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